segunda-feira, 22 de junho de 2015

Harry e Sally, Caetano Veloso e a vida depois dos trinta

Há mais ou menos duas décadas, Harry e Sally - Feitos um para o outro (When Harry Met Sally...) não significou, para mim, nada além de mais um filme numa daquelas pilhas de fitas VHS que eu religiosamente montava às sextas-feiras, quando ia à locadora logo após o colégio para preparar a programação da maratona de filmes do final de semana. Nesse contexto, Harry e Sally surgiu e passou como, digamos, mais um romance bonitinho. As inquietações da Sally, as separações e as frustrações dos personagens, aquela amizade que, apesar da intimidade e dos ares de paixão, não decolava nunca, nada daquilo fazia sentido e, do alto da minha sabedoria adolescente, parecia bastante improvável que aquele take de vida adulta um dia viesse a fazer parte do meu roteiro.

Vinte ou mais anos depois, Harry e Sally está lá, disponível no catálogo do Netflix, a um clique do meu dedo. Okay, por que não assistir de novo? Afinal, um romance bonitinho não costuma fazer mal a ninguém... No meio do filme, percebo que estou levemente boquiaberta e eventualmente fazendo um ou outro sinal de aprovação com a cabeça. Tudo ou quase tudo naquele filme fez ou faz parte do meu roteiro, ou seja, da história da vida depois dos trinta! Descubro, surpresa, que a vida pode ser previsível e que Harry e Sally, produzido no final da década de 80, faz todo o sentido do mundo para mim, agora, na segunda década do século XXI.

Um dia depois dessa iluminação tardia, enquanto assistia ao show do Caetano Veloso no final da Virada Cultural 2015 de São Paulo (que foi alto astral no quesito galera na rua, mas fraca de doer o coração, os ouvidos e os olhos nos quesitos programação e produção), fiquei novamente boquiaberta quando percebi a empolgação da galera quando o Caetano finalmente deixou de lado o repertório do Abraçaço para mandar bala num set list mais conhecido do grande público. Ao final do show, não pude deixar de compartilhar com as minhas amigas a sensação de que, ops, aos vinte e tantos os shows em geral pareciam ser bem mais demais... Okay, Caetano não desperta mesmo, há anos, meu ardor musical e é quase óbvio que se eu estivesse na frente do Jorge Drexler, por exemplo, minha pulsação teria aumentado, mas, ainda assim, fiquei impressionada com a constatação de que, aos vinte, eu certamente teria, pelo menos, encarado o show como algo menos banal. 

Sushi, quase duas décadas de amizade e detentora de uma capacidade de síntese que sempre nos foi útil, mandou mais ou menos o seguinte resumo: "Pois é, Câmis, não dá pra ter tudo: aos vinte os shows eram muito mais legais, mas aos trinta você finalmente entende o roteiro de Harry e Sally." Fomos todas jantar (o que nos empolgou bem mais do que o show em si, outro sintoma clássico da proximidade dos quarenta) e esqueci o assunto. Porém, revendo a situação, mais uma revelação tardia aparece: só agora, passados seis anos da minha década dos trinta, eu começo a entender o que ela significa. Haja delay!!!

P.S.: Para ser justa, admito que fiquei conscientemente feliz por estar em pé na frente da Estação Júlio Prestes numa noite de céu aberto quando o Caetano cantou Sampa. Nesse momento, percebi que, após muitos anos de brigas e discussões, enfim fiz as pazes com São Paulo, a cidade que, apesar de todos os conhecidos pesares, me deu o que poucos lugares são capazes de dar a alguém. Incluindo as décadas de amizade que me cercavam naquela noite.

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