"(...) o homem está condenado a ser livre."
Jean-Paul Sartre em O existencialismo é um humanismo
Foi com um certo prazer erótico que li, lambendo os lábios parágrafo após parágrafo, O futuro de uma ilusão (1927), texto onde Freud destrincha a natureza ilusória das concepções religiosas. Sim, chega a me dar tesão ler algo que encontra ressonância em mim mesma e que me faz vibrar com a sensação quase entorpecente da alegria de me sentir ainda mais inadequada pelos pensamentos que me atravessam.
Esse mesmo gozo, até mais intenso, ocorreu há muito tempo quando topei com Sartre e com o existencialismo, para os quais o texto de Freud me devolveu. Assim como em Freud, em Sartre encontrei as razões mais viscerais para o meu ateísmo.
De O existencialismo é um humanismo fiquei com as marcas da liberdade e da responsabilidade. A liberdade de estar no mundo entregue a mim mesma e a responsabilidade só minha pelo o que eu faço disso. Também fiquei, num resumo bastante grosseiro do texto e da interpretação que fiz dele, com a ideia de que a autêntica necessidade de ter uma vida ética não poderia advir do medo da existência de um Deus malvado e punitivo que imporia um castigo para aqueles que não se comportassem bem em relação aos seus irmãozinhos. Essa seria uma espécie de falsa moral, de ética fake, o exato oposto da retidão. Ou seja, ser "bom" por medo e por imposição alheia não valeria; o valor estaria em determinar-se "bem" independente de recompensas e de punições.
Nessa toada, a hipótese da existência de Deus seria irrelevante pois, mesmo existindo, Deus estaria excluído do valor de verdade da minha conduta existencial, cuja história deveria ser escrita por mim, num movimento autobiográfico.
Agora, Freud vem se juntar a Sartre no meu imaginário existencial, acrescentando outras formas a uma simbolização incessante que teve seu provável início consciente na época do arrebatamento filosófico que relato aqui.
A necessidade de nos consolarmos com a figura de um Deus severo mas protetor, com a perspectiva de uma vida além da morte, com a ideia de que as fatalidades que nos atingem teriam um propósito maior que transcenderia sua natureza de meros eventos fortuitos seria, num resumo excepcionalmente curto do texto freudiano, uma consequência do desespero que se instaura ante o desamparo.
Desamparo, e aqui deixo que os dedos se movam na cadência dos pensamentos que escorrem por eles e que mostram de mim o que fica dos encontros com os outros filosóficos, literários, psicanalíticos, reais, que traz consigo a angústia de nos sabermos sós, cindidos e livres. Liberdade que causa o medo que parece ser o mesmo de que é feito o desespero ante o desamparo e que por vezes vejo lampejar no susto do olhar de quem vê o Deus que eu assumo não enxergar. Medo que talvez reflita o peso aparente da assunção da responsabilidade pelas próprias escolhas e, portanto, pela própria vida. Responsabilidade que, ao contrário do que se possa pensar ou temer, dá, essencialmente, o frio na barriga que sem ele a vida é nada, é só uma sequência de fatos desprovidos de subjetividade, ousadia, alegria, risco e prazer. Afinal, que graça teria ser o personagem de uma história desinteressante, desprovido de desejo e de subjetividade e submetido à parca imaginação de um escritor caprichoso e cheio de não-me-toques?
A minha resposta tenho faz tempo e no desamparo que me causou já muita tristeza hoje encontro a razão para estar aqui. E você, já começou a escrever sua autobiografia?
Esse mesmo gozo, até mais intenso, ocorreu há muito tempo quando topei com Sartre e com o existencialismo, para os quais o texto de Freud me devolveu. Assim como em Freud, em Sartre encontrei as razões mais viscerais para o meu ateísmo.
De O existencialismo é um humanismo fiquei com as marcas da liberdade e da responsabilidade. A liberdade de estar no mundo entregue a mim mesma e a responsabilidade só minha pelo o que eu faço disso. Também fiquei, num resumo bastante grosseiro do texto e da interpretação que fiz dele, com a ideia de que a autêntica necessidade de ter uma vida ética não poderia advir do medo da existência de um Deus malvado e punitivo que imporia um castigo para aqueles que não se comportassem bem em relação aos seus irmãozinhos. Essa seria uma espécie de falsa moral, de ética fake, o exato oposto da retidão. Ou seja, ser "bom" por medo e por imposição alheia não valeria; o valor estaria em determinar-se "bem" independente de recompensas e de punições.
Nessa toada, a hipótese da existência de Deus seria irrelevante pois, mesmo existindo, Deus estaria excluído do valor de verdade da minha conduta existencial, cuja história deveria ser escrita por mim, num movimento autobiográfico.
Agora, Freud vem se juntar a Sartre no meu imaginário existencial, acrescentando outras formas a uma simbolização incessante que teve seu provável início consciente na época do arrebatamento filosófico que relato aqui.
A necessidade de nos consolarmos com a figura de um Deus severo mas protetor, com a perspectiva de uma vida além da morte, com a ideia de que as fatalidades que nos atingem teriam um propósito maior que transcenderia sua natureza de meros eventos fortuitos seria, num resumo excepcionalmente curto do texto freudiano, uma consequência do desespero que se instaura ante o desamparo.
Desamparo, e aqui deixo que os dedos se movam na cadência dos pensamentos que escorrem por eles e que mostram de mim o que fica dos encontros com os outros filosóficos, literários, psicanalíticos, reais, que traz consigo a angústia de nos sabermos sós, cindidos e livres. Liberdade que causa o medo que parece ser o mesmo de que é feito o desespero ante o desamparo e que por vezes vejo lampejar no susto do olhar de quem vê o Deus que eu assumo não enxergar. Medo que talvez reflita o peso aparente da assunção da responsabilidade pelas próprias escolhas e, portanto, pela própria vida. Responsabilidade que, ao contrário do que se possa pensar ou temer, dá, essencialmente, o frio na barriga que sem ele a vida é nada, é só uma sequência de fatos desprovidos de subjetividade, ousadia, alegria, risco e prazer. Afinal, que graça teria ser o personagem de uma história desinteressante, desprovido de desejo e de subjetividade e submetido à parca imaginação de um escritor caprichoso e cheio de não-me-toques?
A minha resposta tenho faz tempo e no desamparo que me causou já muita tristeza hoje encontro a razão para estar aqui. E você, já começou a escrever sua autobiografia?
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