Lembro de ter lido, há muitos anos, em uma biografia do diretor de cinema François Truffaut (François Truffaut, uma biografia, de Antoine de Baecque e Serge Toubiana), que “a vida estava na tela”. Eu andava por volta dos vinte e três anos e creio que talvez tenha sido naquela época que descobri que era portadora de uma quase doença denominada “cinefilia”. Quando exatamente fui acometida pelo “vírus” da enfermidade eu nunca pude divisar; o que eu sei, com absoluta certeza, é que passei a adolescência frequentando locadoras de filmes e esperando ansiosamente pelas tardes de sexta-feira, em que, após o término das aulas, eu tinha permissão para alugar quantos filmes quisesse e depois passar o resto do dia e todo o final de semana em frente à televisão e ao vídeo cassete.
Naqueles tempos eu morava no interior e por muitos anos houve apenas uma sala de cinema na cidade, cuja programação nunca foi, digamos, das mais convidativas. Mesmo assim, confesso, eu assistia a todas as estréias. Sempre.
Mais tarde, em São Paulo, passei a ir ao cinema com frequência: duas a três vezes por semana, sendo que, muitas vezes, de acordo com o tempo disponível e com o humor, saía de uma sessão e entrava em outra. A doença foi se acentuando e houve períodos em que eu precisava assistir a todos os filmes que me interessavam e que estavam em cartaz, pois, do contrário, suava frio e ficava extremamente ansiosa.
Separações, problemas profissionais, questões existenciais de toda ordem? Lá ia eu para o cinema, onde, em frente à tela, nada disso tinha importância. Sim, a vida, para mim, estava na tela.
Provavelmente foi por essa razão que nunca esqueci a frase lida na biografia do Truffaut e porque, nas últimas cenas de Rebobine, Por Favor (Be Kind Rewind, 2008), do diretor Michel Gondry, fui surpreendida por uma espécie de emoção que talvez só os cinéfilos consigam entender.
Contar o que acontece estragaria toda a surpresa; o que eu posso dizer é que Rebobine, Por Favor superou as minhas expectativas e fez com que, por mais de uma hora, eu revivesse os meus bons tempos de VHS e, simultaneamente, sentisse a alegria que se tem quando se sabe que a vida, por mais estranha e difícil que possa ser em alguns momentos, pode sempre estar nas telas.
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