quinta-feira, 1 de janeiro de 2009

"A vida estava na tela"

Lembro de ter lido, há muitos anos, em uma biografia do diretor de cinema François Truffaut (François Truffaut, uma biografia, de Antoine de Baecque e Serge Toubiana), que “a vida estava na tela”. Eu andava por volta dos vinte e três anos e creio que talvez tenha sido naquela época que descobri que era portadora de uma quase doença denominada “cinefilia”. Quando exatamente fui acometida pelo “vírus” da enfermidade eu nunca pude divisar; o que eu sei, com absoluta certeza, é que passei a adolescência frequentando locadoras de filmes e esperando ansiosamente pelas tardes de sexta-feira, em que, após o término das aulas, eu tinha permissão para alugar quantos filmes quisesse e depois passar o resto do dia e todo o final de semana em frente à televisão e ao vídeo cassete.

Naqueles tempos eu morava no interior e por muitos anos houve apenas uma sala de cinema na cidade, cuja programação nunca foi, digamos, das mais convidativas. Mesmo assim, confesso, eu assistia a todas as estréias. Sempre.

Mais tarde, em São Paulo, passei a ir ao cinema com frequência: duas a três vezes por semana, sendo que, muitas vezes, de acordo com o tempo disponível e com o humor, saía de uma sessão e entrava em outra. A doença foi se acentuando e houve períodos em que eu precisava assistir a todos os filmes que me interessavam e que estavam em cartaz, pois, do contrário, suava frio e ficava extremamente ansiosa.

Separações, problemas profissionais, questões existenciais de toda ordem? Lá ia eu para o cinema, onde, em frente à tela, nada disso tinha importância. Sim, a vida, para mim, estava na tela.

Provavelmente foi por essa razão que nunca esqueci a frase lida na biografia do Truffaut e porque, nas últimas cenas de Rebobine, Por Favor (Be Kind Rewind, 2008), do diretor Michel Gondry, fui surpreendida por uma espécie de emoção que talvez só os cinéfilos consigam entender.

Contar o que acontece estragaria toda a surpresa; o que eu posso dizer é que Rebobine, Por Favor superou as minhas expectativas e fez com que, por mais de uma hora, eu revivesse os meus bons tempos de VHS e, simultaneamente, sentisse a alegria que se tem quando se sabe que a vida, por mais estranha e difícil que possa ser em alguns momentos, pode sempre estar nas telas.

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