sexta-feira, 6 de maio de 2022

Que porra é essa?

Mas sutilezas insignificantes são a única diferença entre uma coisa que é especial e uma pilha enorme de lixo vagando pelo espaço.

Elif  Batuman em A idiota



O que é o amor?

Será que é aquilo que a Piper, de Orange Is the New Black, diz quando fazem a ela e às outras detentas essa mesma pergunta? Ou será que é o momento em que o padre gato olha para o mesmo interlocutor invisível da Fleabag (no caso, ela mesma), aquele com o qual ela interage o tempo todo sem que mais ninguém perceba? Ou talvez seja o instante em que ela é capturada pelo pescoço do padre enquanto os dois caminham pela rua ou, quem sabe, o momento em que ela, ao contrário do que sempre acontecia com outros caras, bate na câmera e tira de cena o interlocutor invisível (e também o espectador) quando os dois estão transando? Ou será que o amor é aquilo que está nos filmes do Truffaut e do Rohmer, nas definições de Lacan e de Espinosa, em Platão, na definição que bell hooks empresta de alguém... Você saberia, afinal, dizer o que é o amor com as suas próprias palavras?

E atualmente, será que o amor se resume ao resumo de tudo um pouco que está nos quadrinhos de Liv Strömquist? Será que é possível amar alguém e querer ter todos os outros ao mesmo tempo? Quem tem a certeza de que dá para ter tudo é o quê? E quem acredita que o outro está aí existindo com a finalidade única de ameaçar a sua paz, aquela que de tão intensa o faz tomar indutores do sono para poder dormir em paz durante as madrugadas e que, para suportar a paz dos seus dias, precisa terminá-los se anestesiando?

Alguém tão maravilhoso, detentor de algo tão desejado, por que não seria conveniente que todas tivessem um pouquinho dele para si, mesmo que por apenas algumas horas, alguns dias, de vez em quando, quando ele pudesse lhes dar aquilo que elas querem tanto e tão desesperadamente? Mas ele, tão honesto, não vê as coisas assim, não está acostumado com as relações plásticas de hoje em dia. Desconhece, mas odiaria o Bauman. Que história é essa de amor líquido? Com ele não, com ele não é assim, com ele as relações superficiais são profundas, complexas.

E por que será que Freud falou do amor num texto sobre o narcisismo? O que o amor teria a ver com o narcisismo? Com o primário, com o secundário? E aquele que vive no reino da paz inabalável, será que já passou do primário? E quem anda por aí arrastando correntes de outras vidas e projetando os seus medos e fracassos naquele outro que é uma ameaça em potencial à sua tão preciosa paz, quem seria ele? Aquele personagem dos quadrinhos que vive o luto eterno da morte dos pais dentro de uma caverna? Ou talvez aquele famoso personagem da literatura que, na linguagem popular, dá nome ao conquistador barato? Ou, simplesmente, um desconhecido, alguém sem grandes distinções?

Mas a pergunta, afinal, era outra.

A pergunta é, o que é o amor, com as suas próprias palavras?

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